Sunday, September 9, 2007

PESTE NO AVANTE!


'Revolução' foi regresso em cheio na Festa do Avante 2007. Almendra e San-Payo, alma e cérebro desde o primeiro momento, rock-ska-apunkalhado – homenagem a Joe Strummer pelo meio… –… faziam falta, estes tipos… E a verdade é que este refrão te vai dar motivação…!
Como se o tempo, quinze anos, fosse um piscar de olhos, eis o novo tema para se comparar com 'Gingão', da altura em que uns hoje desaparecidos MACHINA POPSUTA, de Piricas – salvé grande vocalista-actor, que olhava o público nos olhos e lhes escarafunchava a alma – impressionavam, e que uns ainda também hoje obscuros MELLERIL DE NEMBUTAL debutavam na 'cena de Alvalade' e até chegaram ao Coliseu… e os KUS davam os primeiros [glup!] acordes…
Nós por cá, nessa altura mítica, ressacávamos do progressivo com os SON CORFU. Num concerto no PAV, Almendra et all no público, viram o nosso vocalista [Rodrigo Gillan Leal] furar o palco depois de um salto épico a terminar a curta apresentação e deliraram…!, e ainda faríamos mais tarde, por uns meses, uns titubeantes POP OVO onde quase-singraram este vosso bloguista no baixo [emprestado pelo dos Melleril, hoje quadro Gulbenkian em Londres] , João Moura na guitarra [mais tarde o Roque, hoje artista plástico], de novo o alucinado-controlado Piricas na voz, João Morais na outra guitarra… Para a história: o almoço de escolha do nome, ali prá Infante Santo. Foi um dia de sol, passado numa tasca em brainstorming delirante até se chegar ao nome. Horas de tempo só nosso, um dia absolutamente solar, infinito e juvenil. Trata-se de um furo lento…. Hoje os furos são outros e foi bom ouvir o 'Furo na cabeça' dos Peste, para colocar memórias no lugar. E no altar.

A checkar:

http://www.youtube.com/watch?v=rch-sxY0Ymk&mode=related&search=

http://www.youtube.com/watch?v=QZK2B_GSTzw&mode=related&search=

Friday, June 22, 2007

Memory Lane III – O blues do Sapo!

Para que é que um tipo quer o punk ou a new wave quando temos isto? Ou será que isto é punk-rock?



E há a questão de por uma vez o palco ser espaço público, transicional, em tensão… no sign of security, regras não ditas, utopia de 3'…

Memory Lane II – Mais solidao…

Outra versão da mesma solidão…

Memory Lane I – A solidao infinita de um bar de estrelas

E agora uma tripzinha nostálgica ao blues-rock como cosmovisão…



Rory Gallagher - A Million Miles Away Irish Tour 1974

Luz-boa: elogio do Efemero – uma modalidade da arte do Espaço PUblico



Este é um breve excerto de um trabalho de investigação em curso, sobre 'A Arte do Espaço Público'.

INTRO

«O ideal de uma racionalidade organizada em torno de procedimentos comunicacionais é um ideal iluminista. A comunicação apresentou-se em termos modernos como uma espécie de garantia colectiva da transparência e do carácter público da razão contra o terreno movediço ou (co)movente das inclinações, das paixões, dos sentimentos, i. e., da afectividade em geral, que consistiria na própria suspensão de uma racionalidade comunicativa. Remetida para o domínio da experiência estética, a afecção teria então como abrigo privilegiado e mais elevado o território da obra de arte. Os processos da constituição moderna da experiência não confirmaram de modo algum esta distinção. Pelo contrário, os fenómenos da comunicação são cada vez mais um território penetrado pela experiência da afecção. A superfície de hiperactividade comunicacional que envolve a totalidade da experiência constitui cada vez mais uma espécie de enorme zona erógena colectiva. A resposta estética mais forte a esta situação foi a da estratégia do choque, apesar de ser um modo radical de afecção, funciona simultaneamente como uma anulação da experiência afeccional, anulação que se reforça aliás com a repetição do próprio choque e que tem provocado nas artes uma espécie de estado generalizado de trauma. Uma das tarefas de uma estética contemporânea é certamente a de reflectir sobre este estado traumático das artes no contexto de uma experiência fortemente estimulada pela comunicação aos mais diversos níveis.» Maria Teresa Cruz«Arte e afecção»


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Na Cultura Contemporânea, há a emergência significativa de um território específico, o de uma arte que acontece sempre que criadores-activistas se engajam em projectos artísticos e culturais de vocação social, que aspiram, no seu discurso e na sua praxis, a simultaneamente reflectir, comunicar e intervir de forma intencional, activa e participada no tecido social.

Falamos de um interesse pelo mundo que não consegue eliminar da equação artística ou do projecto cultural nenhum destes três aspectos, considerados como fundamentais e necessariamente em articulação: um aspecto intelectual e meta-operativo, no sentido de uma reflexão sobre os próprios modelos e premissas conceptuais; um segundo aspecto que poderíamos chamar eminentemente plástico e estético; um aspecto político, no sentido de intervenção na polis enquanto configuração do real e o mundo social, com o meio urbano a funcionar como palco privilegiado para a responsabilidade ética perante a Comunidade.

Não se trata de uma maneira completamente nova de encarar e produzir Arte: experiências históricas anteriores definiram os territórios da Arte Contextual ou da Arte Situacional, hoje relativamente estabilizados e onde encontramos inúmeras acções de referência. Do Surrealismo às Internacionais Situacionista e Letrista, de Beuys a Wodickzo, e com particular evidência nos anos 60, sucederam-se operações estéticas empenhadas num repensar da relação entre a Arte e o Real Social, assumindo uma miríade de formas públicas que oscilam nomeadamente entre, num pólo, acções fundamentalmente individuais, mais ou menos generosas ou exemplares, e Projectos culturais, eventos aglutinados em torno de programas resultantes de redes organizacionais mais complexas, cujos discursos respondem a funções urbanas e sociais específicas, de carácter relativamente institucionalizado.



Pode por isso dizer-se que, perante a multiplicidade de campos e estratégias que constituem hoje o terreno de acção da Arte, é oportuno fazer-se uma reflexão de síntese sobre as várias formas que, nesse âmbito, o sentido do social assume, nomeadamentre em Portugal. Os casos que pretendemos evidenciar são aqueles em que, na contemporaneidade, se conjugam, em equilíbrio dinâmico, no quadro de uma postura transversal e transdisciplinar, e com expressão assumidamente pública, as funções reflexiva, estética e política da intervenção artística.

Por uma questão não apenas de simplificação da nomenclatura, mas de orientação da linha de pensamento que se propõe, aspirando a uma comunicação alargada e generalista, falamos de Arte Pública ou de Arte em Espaços Públicos, ou não fossem ambas as categorias, quer ‘Arte’, quer ‘Espaço Público’, suficientemente latas, abertas e problemáticas para albergar as nossas intenções retóricas.

Na prática, trata-se de fundamentar, com exemplos concretos, sobretudo nacionais, e a partir de uma leitura crítica do panorama artístico português, uma suposição simples: há lugar na Contemporaneidade para uma Arte do Espaço Público, capaz de gerar comunicação, motivação e sentido crítico, num patamar de interactividade social mais complexo e transformador que aquele que define os circuitos e contextos artísticos tradicionais. Essa arte é hoje pontualmente posta em movimento por agentes culturais cujos objectivos, motivações e enquadramento teórico importa relevar, por oposição a posições perante o campo da Arte consideradas imobilistas, conservadoras ou alienadas.

[…]

É com o Barroco que o Efémero faz a sua entrada na História como nova dimensão da arte e da vida. Este efémero barroco é agora «um novo paradigma temporal em que se conjugam o frágil, o passageiro, o perecível e o vão». Nasce deste cadinho um verdadeiro cogito do efémero, que volatizará progressivamente as antigas relações do Ser e do Devir, características da metafísica ocidental e do humanismo da Renascença. Si le passé n’est rien, le futur ne sera qu’un nuage où s’accroche un présent qui fuit. L`Être n’est que son apparaître instable, entre ‘il y a’ et ‘il n’ya oplus’, comme dans la pensée chinoise. C’est pourquoi l’éphémère est un présent intensifié par un manièrisme du temps. […] Car si tout fuit, il faut saisir l’occasion dans une innovation continuée, et pratiquer un maniérisme occasionnel. ‘A ocasião’: eis um conceito-chave que abre a oportunidade para a afirmação do conceito de ‘intenção de ser’ . Eis a oportuniadde para acção, para a performatividade do social, para arte pública.

Se ocasião faz o projecto, a gestão das condicionantes específicas determinam-lhe a essência, despudurodamente, para aqueles que esperariam, no caso da Arte Pública, que a Obra fosse um mero transpor para o espaço Urbano de uma Ideia pré-concebida em ateliê. Se isso acontece com muita frequência, certamente que na Arte Extramuros a premissa é outra, a de auscultar-se o território e as suas energias, o espaçao na sua multiplicidade de componentes, nomeadamente a social, numa fase do projecto em que as decisões estão mais em aberto que definidas. Isto explica uma obra como Coração de Jana Matejkova [Luzboa, 2006]; e sobretudo o processo criativo que a levou às soluções apresentadas. Vale a pena considerar os primeiros ante-projectos: instalações in situ em momentos de um previsível percurso, todas com sabor a conquista de espaços problemáticos – abandonados, utilizados pro comunidades marginais, que artista se propõe habitar com obras-interface, como no caso extremo em que propõe uma carreira de tiro, com alvos aplicados comos e fossem azulejos num espaço-reuína nas traseirtas de um hotel de luxo.

O facto de a Bienal acabar por não passar por ali vai levar a artista a desenvolver uma à partida mais pacífica: um ‘electrocardiograma dacidade’, a instalar ao longo de um eixo longitudinal, o passeio pedonal que acompanha o limite do Jardim do Príncipe Real na Rua da Escola Politécnica. A Chegada a Lisboa implica de imediato um conjunto de decisões profundas: o labirinto longitudinal e bidimensional tranbsforma-se em habitar de um espaço circular em torno de uma velha árvore; estabelece-se uma empatia com o espaço físioco e o espaço social daquele lugar – ali se encontra um bar-restaurante que fechará em breve, previsivelmente nos últimos dias da Bienal. A artista e o seu colaborador, Carlos de Abreu, iniciam o trabalho árduo, diário, metódico e regular de instalar naquele espaço público um labirinto de luz, agora emaranhado de traços e curvas, entrecuzando-se como desafio ao corpo. Esse desafio é agora um work in progress que continuaria para lá do início da Bienal, caso mais dias houvesse; que se tornou uma obra-habitar, com assistentes e vizinhos envolvidos nas decisões diárias; com um gesto final da artista que procura celebrar aquela relação por via de uma performamnce no último dia do Bar. A disponibilidade da própria Organização para ‘fechar os olhos’ perante uma ‘festa’ não autorizada apenas comprova que, para a Organização, a obra era o todo processual, que de resto, face ao contratualizado e maquetado tinha diferenças substanciais (restou a cor, a ideia de labirinto, nada mais].

Coração exemplifica a ideia de celebração do efémero como conquista do momento favorável. O artista extramuros que sabe da potencialidade do efémero empreenderá uma operação estratégica de captação do tempo, um tempo que resgata aos fluxos imperceptíveis, aos intervalos das coisas, dos seres e da existência. A obra torna-se por essa via um convite à compreensão do tempo – um aforismo, um ensaio… E não apenas para os criadores: para os transeuntes é um desafio à sua própria conquista do tempo, o tempo de estar ali, de aderir ou não, de imergir ou não numa proposta existencial e política disponível para o imprevisível.

Em espaço urbano, como o mostram inúmeros eventos da Extra]muros[, essa estética torna-se rapidamente uma política, no sentido de Arendt, que foi quem fez das aparências e de uma visibilidade plural as próprias condições para a nexistência de um verdadeiro Espaço Público. Acósmico , segundo Buci-Glucksmann, precisando: Il convient donc de différencier léphémère du seul instant comme ‘coupure du temps’ au sens aristotélicien, mais aussi du seul présent vécu. L’éphémère est un art du temps, qui consiste à l’accueillir, á céder au temps (tempori cedere), et à l’accepter tel qu’il est, fût-il imprévisible.

O Estoicismo de Montaigne estabeleceu um modelo-chave para esta acepção do tempo como vazio-cheio, oportunidade de redenção, palco da individualidade, algo que de forma mais directa e sucinta se poderia definir como ‘arte-do-efémero’: Il est beaucoup plus proche de la quête de l’intervalle propre à la culture japonaise du Ma (espacement, intervalle, vide) que de la seule jouissance hédoniste du présent qu’il implique. Car tout passage est fugitif et fragile, et rentrer ao coeur de l’occasion comme ‘rencontre’ implqiue de traverser le temps, de lui donner son rhythme, ses aiguillons, ses intensités et ses intranquilités. Una sagesse toute musicale en somme qui me fair penser aux Papillons d’un Shumann, ou aux vibrations et suspensions sonores des Glissandi de Ligeti. L’éphémère n’est pas le temps mais sa vibration devenue sensible.

Não poderia haver melhor descrição do trabalho de habitação temporal que os belgas Het Pakt empreenderam nas Escadinhas de São Cristóvão, em Lisboa. A peça aparentemente mais frágil, mais dependente da proximidade dos [apesar de tudo poucos] moradores e seus humores, recorrendo aos dispositivos mais primários de produção de luz e imagem [captação por pin hole, projecção por projectores de slides] encontrou o registo certo, no espaço adequado [pela sua configuração de anfiteatro controlado], para um momento da Bienal que superou todas as naturais expectativas criadas pelo conceito inicial. Se este era prosaicamente o de celebrar a alma [musical] de uma cidade, criando um ‘coro urbano’ de vozes individuais que, juntas, compusessem uma espécie de consciência-memória colectiva, proporcionando a partilhade emoções profundas [decorrente de um processo de composição das imagens participativo e aberto à comunidade e às próprias equipas de produção executiva da Bienal]; o resultado foi uma rara oportunidade de milhares de visitantes se verem confrontados com uma instalação que, para regressar aos termos estéticos mais capazes de a descrever, permitia um raro tipo de fusão entre espectador e obra, um ‘fazer corpo com o dao’ .



Si bien que tout est dans un temps vouéà l’éphémère, et à cette ‘impermanence’ japonaise (mujô) ou, très curieusement, l’esthétique du temps et des manières rejoint certaines préocupations de Pessoa, dans une même quête de l’intervalle.

Algo de semelhante terá acontecido no momento partilhado do concerto de Adriana Sá, também no rosto boticelliano de Gerald Petit, da Débora. Em todos os três casos, embora em graus diferentes, a intranquilidade – o desassossego, para permanecer em Pessoa – que caracterizam a forma nostálgica do efémero, enquanto ‘nostalgia do possível’, dão lugar auma forma mais diáfana, ligeira e positiva. Petit no topo do Percurso Azul tinha essa função de fusão-com-o-horizonte, de reencontro com o território e a paisagem, de imersão na noite, animada e viva [os pontos LED tremeluziam, numa imagem equidistante do kitsch e da estética publicitária, ainda que devendo a ambas o poder de atrair imediatamente.



Il faudrait donc distinguer au départ deux formes de l’éphémère. Dúne part, un éphémère melancolique, constitutif du baroque historique ou du moderne (Baudelaire, Benjamin, Pessoa, etc.), qui est d’emblée aussi ambivalent que le clir-obscur et le spleen allégorique. Et, d’autre part, un éphémère positif, plus exoplicitement cosmique, qui traverse déjà l’histoire du regard en France au XIX siècle (cf- Monet), et qui m’a paru servir de ‘pont’ théorique entre l’Asie et l’Occident. Se houve intervenção na Luzboa capaz de condensar esta positividade, para mais num plano estritamente festivo, convivial, foi Demo_polis dos Moov. Aí sim, o efeito efémero se encontra – como no airy nothing de Shakespeare – inseparável do seu afecto como energia. Na Lisboa Capital do Nada, o cordão humano conseguiu por instantes condensar esta positividade vazia do efémero, a gratuitidade de um gesto magnânimo, tão fútil quanto absolutamente necessária uma ideia de Comunidade em construção. Tal como aconteceu ainda nesse ano com os cinco sucessivos recitais [colagens?] de Belcanto, em cinco diversos espaços-tipo da cidade de Lisboa, a peça de Catarina Campino que mais claramente enunciou um efémero irrepetível, condensadíssimo.



Mas com a Luzboa esta ciência urbana que é captar por meio de dispositivos artísticos a energia comum, do social, ganhou formas mais adequadas, mais directas: um kairós fugaz, característico dos espíritos disponíveis, desdobra-se em todas as vibrações da luz, em tudo o que cria uma instabilidade cintilante, jogos de reflexos e pulsações visuais. Torna-se instável. Aparência instável e arte da diversidade. Discurso das realidades fluídas – por aí profundamente anti-institucional, anti-burocrático, porque cadinho do estar-com e não do estar-sob. Como aconteceria até emmso com a Lua de Peinado, um objecto de todos, que todos tocaram, infantilmente. Peinado conseguiu oferecer à cidade não apenas uma imagem-ícone (sempre útil para pazer passar a comunicação na era do audiovisual ultra-rápido), mas um decoração do espaço comum de uma praça, de tal maneira que também ali se tornou positivo o tempo-fluxo, ali onde se deu uma evidente metamorfose, uma simulação que convidava à momentânea e cúmplice suspensão do juízo.

A arte efémera é o discurso artístico deste Tempo-fluxo. C’est précisément ce temps-flux, venu d’Héraclite, qui sera ordonné par l’Être par Platon. Car la vraie lumière ne viens pas des apparences, mais du soleil intelligible de la Verité ou de la Beauté (Da República). Uma instalação urbana [como a de Peinado], pode estar parcialmente assente nesta ideia de uma luz ontológica – que serviu muito tempo de paradigma artístico, ao seu ideal e às suas pesquisas sobre a ordem e de harmonia entre partes. Mas a sua efemeridade, celebração do fluxo, condu-la para um território que já Malevitch entrevira, no texto «A Luz e a Cor». Nesse texto, o pintor russo coloca em causa o estatuto da luz na arte, contestando uma luz que ilumina a verdade e desenvolvendo um anti-platonismo da ‘intensidade colorida’, onde o novo corpo pictórico é construído pela luz em si. Malevitch toca o essencial. Entre le voir et le savoir, la peinture et la pensée traversent toute une série de prismes, où la lumière ‘acquiert des significations réelles’, et cette treversée est l’indice dúne sorte de matérialisme lumineux, qui sera au coeur de l’art cinétique comme de l’art virtuel.

[…]

De Gasco a Peinado, dos Moov a Petit, foi isto o que se passou. E é esta fluidez e abertura que chocou quem procurava tanto a obra definida e formalmente limitada, disponível para ser criticada enquando configuração física, ou quem procurava o espectacular imediato, sem conceito mas capaz de impressionar retinianamente.

É certo, a Estética do Efémero deve a sua afirmação progressiva a muita da arte do século XX, apaixonada pelos vidros, os espelhos, as transparências, e depois os tempos-fluxo. E os virtuais, que emanam ainda dessa ‘radioactividade pneumática’ que Platão atribuía à beleza ‘não preguiçosa’, à sua graça vivificante e à sua capacidade de animar mesmo as qualidades mortas. O efémero de um je-ne-sais-quoi, que age como sedução tem uma genealogia que a Luz-boa vai procurando surpreender.

Uma leitura de
Christine Buci-Glucksmann, Esthétique de l’éphémère, Galilée, Paris 2003
Imagens: www.luzboa.com

Out of the Blue – Into the Black

Este filme é beleza absoluta dos destinos humanos em contingência. Musicalmente a – na altura – improvável articulação entre o Young-para-sempre-inoxidável e Rotten-gone-but-not-forgotten. Lembro-me de o ver umas três vezes segiudas no Quarteto, com os amigos com quem escrevíamos poesia em conjunto e comíamos cachorros na sala. Foi o tempo de Blade Runner, de A Lua na Valeta, Querelle, Tarkovski, O Raio Verde… um tempo de sabor a sal, a ganga, a tintas, a 17 anos em quartos vermelhos… o som desse tempo? Lou Red de The Blue Mask [My House], mas também Ommadawn de Mike Oldfiled, ainda a Caixa Geral de Depósitos não tinha deitado abaixo a fábrica de cerâmica à João XXI, e lembro-me de uns poucos concertos míticos: Magudezi, Ocaso Épico. Um filme must porque tem a pâtine da [minha] juventude, a nossa e a do filme, essa a eterna. Linda Manz forever!!! Deusa-juvenil-arrapazada. Punk before punk. Bacante imolada no silêncio do amor. Rigorosamente para além do bem e do mal.

A razao do Lagarto. Em 1969!

Não sou propriamente um 'Lizardiano', mas que o Contador tem razão quando diz – 'tá lá tudo… – tem…:

Wednesday, May 30, 2007

Em Leiria, Um Solo a Dois revisita 'Orgia' de Pasolini


Ana Rosa Abreu e Daniel Coimbra voltaram a exceder-se na renovação da linguagem e da temática de Pasolini, numa noite íntima no Teatro O Nariz, em Leiria. Luzes minimais, um registo no limite da stand-up comedy e da Revista à Portuguesa, sempre no limite, do corpo e da palavra, com traços de enorme maturidade na leitura do texto, na gestão dos silêncios, na violência contida, na gestualidade precisíssima... Último espectáculo do Festival Mercúrio, da ESAD.CR, primeiros passos numa carreira que se quer original e independente. Talento e verve! Faz cocó! E se estes meninos fossem/[são?] já uma certeza maior do Teatro Português? Façam favor de não se estragar! A foto é do 'sempratento' Márcio Silva.

Tuesday, May 22, 2007

Miguel Chevalier




Já não apenas a cidade tornada virtual dinâmico, eis a(s) arquitectura(s) e o ciclo da vida e do tempo de um Monet revisitado (d'après Christine Buci-Glucksmann, Esthétique de l'éphémère, Galilée, Paris, 2003.

Chevalier (México, 1959), esteve em Lisboa, na Luzboa 2006, com um relativamente discreto Sur-Nature projectado na fachada dos Armazéns do Chiado. Interactividade e escala, numa realidade virtual luminosa.

Nunca é demais referir um artista francês que desenvolve em cada novo projecto soluções tecnológicas e dispositivos formais inovadores, sem nunca deixar de perseguir um caminho encetado desde que se revelou pioneiro das artes digitais.

Volta depressa!

Festival Glow brilha… em Eindhoven



Light as a complex phenomena needs sites which stimulate perception processes which go far beyond the visibility of the naked eye.

Stefan Hofmann


Eindhoven é a quinta maior cidade dos Países Baixos, com cerca de 200 000 habitantes. Deve o seu desenvolvimento industrial em grande parte à Philips, cuja primeira fábrica aí foi fundada. Em 1891, o objectivo de Frederik Philips e seu filho, Gerard, era o de criar lâmpadas baratas, eficientes e confiáveis. Hoje, a Philips, para além de inovar na área da Imagem ou das Tecnologias Médicas, ilumina monumentos mundialmente conhecidos e mantém na cidade os seus escritórios, onde funciona um centro de demonstração de tecnologias de iluminação.

Em Eindhoven, cidade que a II Guerra Mundial quase destruiu por completo – donde a modernidade dos seus edifícios – ao mesmo tempo que se respira a atmosfera pacata de uma pequena urbe europeia, vislumbram-se desde há alguns anos traços notórios de investimento num Conceito Urbano que associa o passado industrial, ligado à Iluminação, à busca de um desenho urbano integrado e à promoção de oportunidades de marketing estratégico. O Município local está interessado em promover a cidade como foco de investimento na área da Alta tecnologia e dá enorme importância à questão da criatividade. Daí à ‘Arte da Luz’ foi um passo.

Eindhoven integra as várias acções relacionadas com a Luz em contexto urbano numa ideia genérica mas clara: ‘Eindhoven City of Light’. Trata-se de um Plano que precisamente aglutina intervenções arquitecturais, projectos independentes, arte pública, festivais urbanos, toda a gama de acções que dão valor à componente Luz no Projecto Urbano. Esta dinâmica, pública e privada, articula ainda encontros, conferências e, em destaque, o estreitamento das relações com a LUCI – Lighting Urban Community International [Rede Mundial de Cidades-Luz que Eindhoven integra oficialmente desde 2007].

No quadro dos eventos preparatórios de Eindhoven City of Light, havia que desenvolver no final de 2006 um projecto experimental e artístico que, de forma efémera e recorrendo a um budget relativamente baixo, celebrasse o ambiente positivo da cidade e centrasse a opinião pública nas temáticas da Luz. Bettina Pelz, curadora do Festival Lichtrouten na Alemanha, lançou mãos à obra e reuniu na cidade, de 24 Novembro a 3 Dezembro, um programa diverso composto por 14 peças que dialogaram com a restante oferta da cidade de forma subtil. Sob a designação de GLOW – FORUM OF LIGHT IN ART AND ARCHITECTURE, artistas de vários países, representantes de vários festivais europeus [incluindo Portugal, com a Luzboa a ceder a obra Family Idea, de Ron Haselden, que esteve em 2004 nos Jardins do Parque Eduardo VII] proporcionaram uma mostra de arte urbana que primou pela rara associação entre inovação técnica e capacidade de adaptação ao meio urbano.

Estiveram presentes, entre outros, os artistas Francesco Mariotti, Richi Ferrero, Miriam Giessler e Hubert Sandmann, Lichtpunk, Maria Hansar, Klara Hobza, Rochus Aust; os criadores-produtores Peter Brdenk, Veronika Valk, Jean-François Arnaud, Jean-Claude Deschamps, Bettina Pelz e Tom Groll; todos eles, no seio de uma curadoria partilhada entre os alemães Bettina Pelz e Tom Groll, foram responsáveis por um conjunto de peças brilhantemente inseridas nos espaços da cidade – jardins, palácios, fachadas de edifícios, museus, cabines telefónicas…

A intenção do Evento era clara: agendar uma dimensão mais poética, mas também mais precisa e focada, da Arte da Luz. Fazê-lo ao longo das margens do Rio Dommel, onde a menor iluminação pública permitiria a cada obra apresentar-se em máximo esplendor, foi uma solução primorosa. De 24 de Novembro a 3 de Dezembro de 2006, esta opção revelou Eindhoven como um incontornável destino-Luz.



Um museu a arder?

O conjunto de obras constituiu um todo articulado, unido pela ideia de obscuridade e máximo cuidado na apropriação dos espaços públicos, donde que apenas pontualmente as peças se notabilizaram pela imponência. Foi bastante mais impressivo perceber como algumas delas davam a ver o desenho arquitectónico de edifícios, a vida dos espaços verdes ou de um lago, a própria intimidade de um hall de uma casa antiga. Aqui se apresentam algumas das obras que de forma mais original assumiram este programa, aliando dispositivos tecnológicos que raramente terão sido tão bem equlibrados com o sentido estético.

O concepção do evento de abertura foi entregue a Xavier de Richemont. O artista francês partiu da célebre máxima de Picasso – Queimem todos os museus – e literalmente – pelo menos a nível visual – pôs o importante Van Abbe Museum, uma instituição de referência da Arte Contemporânea… a arder. Foram usados três projectores Pani BP 6Gt, com gobos rotativos semelhantes a projectores de Teatro. O efeito, apesar de simples, é cinematográfico e dá realmente a ideia de que o Museu está em chamas… O som foi uma dimensão fundamental deste projecto: sincronizado com dezenas de projectores Citycolor e iluminação cénica vermelha, um sistema em surround ampliava os efeitos lumínicos com gravações do crepitar de chamas. Óbvio? Nem tanto, até pelo fair play de um Museu que aceita ver-se posto em causa, mesmo que metaforicamente!

In Sight de Tom Groll/Bettina Pelz foi talvez a intervenção mais impressionante, pela escala sobretudo, pelo rigor da montagem, pela relação com a história da cidade. Apenas com recurso a três projectores Pni [Modelo BP 6GT], a uma distância de 90m [o que fazia com que a fonte de luz e as estruturas de apoio fossem praticamente invisíveis], a Igreja de Sta. Catarina foi transformada numa presença estranha na cidade. Estranheza porém inspirada na realidade: diapositivos de grandes dimensões [15x15cm] projectaram na fachada, recortada na noite, manchas que no programa eram explicadas – mega-ampliações [1:3300] de fotografias das microestruturas das próprias madeiras utilizadas na construção do monumento – em resultado de um processo de análise e registo idêntico ao que sofreram as relíquias de esqueletos encontrados em escavações recentes na praça… De novo um delicado equilíbrio entre iconoclastia e veneração, que tão bem convém à arte em espaços públicos. Os diapositivos eram mudados de três em três dias, de contrário queimar-se-iam.

Tom Groll apresentou em nome próprio Talking Lights. Integrou bandas de RGB multicor nos vidros de três cabines telefónicas, fê-las reagir, por meio de tecnologia DMX, às qualidades acústicas das vozes dos transeuntes que entrassem e levantassem o auscultador, numa peça que é simultaneamente design de vanguarda e crítica da monotonia que normalmente define os equipamentos urbanos. Três cabines telefónicas passam a poder comunicar a sua presença e a dos seus utilizadores, emitindo na noite as múltiplas emoções que imaginamos povoam aquelas conversas. Uma obra de arte particularmente ‘útil’ se quisermos ultrapassar, nem que por apenas uns dias, a inóspita indiferença dos não-lugares.


Com z.T./w.T., o coreano Tae-Gon Kim. reservou-se a capacidade de… brilhar. A peça é pequena e até insignificante, se considermos a escala urbana. Mas as ideias não se medem assim, e mesmo nas fotografias o impacto da obra é inegável. Um vestido integralmente realizado em fibra óptica. Luz emitida e canalizada a partir de um projector de slides – uma das soluções técnicas surpreedentes da obra – alterando-se na temperatura de cor, como se de um cristal mecânico de tratasse. 80 variações para uma mesma magia, a de um vestido-pessoa em suspenso, à espera do fantasma de não sabemos que época ou lugar. Uma belíssima homenagem ao tempo!


Eindhoven revelou com o festival Glow uma abordagem muito válida da relação entre Arte e Cidade, num registo low profile e de enorme sensibilidade. Se cada cidade fosse como uma Vida, Glow terá sido um dia feliz na existência da Capital da Lâmpada. Philips teria gostado.

Mário Caeiro



IN SIGHT Manchas projectadas a toda altura da fachada da mais importante igreja de Eindhoven. Projecto de Bettina Pelz e Tom Groll. Foto de Claus Lager.

z.T./w.T. Emocionante e delicada presença etérea de um corpo. Fibra óptica trabalhada ao detalhe, com luz intermitências na potência e fluxo de luz – pelo artista coreano Tae-Gon Kim. Foto de Claus Lager.

SECOND SKIN Stefan Hoffmann interpreta a geometria de fachadas como se de uma ‘segunda pele’ se tratasse. Dinâmicas e fluidas, a projecção de linhas em lenta mas permanente evolução revela um quase primordial fascínio pela desenho e a geometria do edificado. Foto de Claus Lager.

TALKING LIGHTS Uma cabine telefónica que muda de cor, reagindo interactivamente às qualidades de cada voz que liga… Um projecto de Tom Groll. Foto de Claus Lager.

CAPSULE Surpresa no parque. O duo germânico Miriam Giessler & Hubert Sandmann num exercício de consciencialização ambiental. Foto de Claus Lager.

SWINGING IN THE LIGHT O Inverno pode ser divertido! Directamente da Estónia e de temperaturas abaixo dos 30º negativos, balouços-casulos para o transeunte urbano. Projecto de Veronika Valk. Foto de Claus Lager.

BE CAREFUL WITH LIGHT Peter Brdenk estabelece um padrão de máximo rigor na leitura minimal de uma fachada banal. Foto de Claus Lager.

QUANTUM FLOWERS Franceso Mariotti propôs uma peça sensível e delicada, espécie de nenúfar tecnológico realizado a partir da reutilização de garrafas de plástico. Os LED no interior, alimentados a energia solar, nem sempre fizeram justiça às ideias de um artista italiano de referência. O sol pouco brilhou. Foto de Claus Lager.

MIGRATION Jean-François Arnaud reinventou as gaivotas da Ilha de Rousseau por meio de projectores e imagens recortadas esvoaçando nos ramos de monumentais árvores. Um projecto estreado no festival Arbres et Lumières, de Genebra. Foto de Claus Lager.


Mais info: www.gloweindhoven.nl

Monday, May 21, 2007

Memory Lane 1 – Rory lives!

E agora uma tripzinha nostálgica ao blues-rock como cosmovisão… Cortesia You Tube.

http://www.youtube.com/watch?v=RxiEMpcI83E&mode=related&search=

http://www.youtube.com/watch?v=bXHJO5rWuCU&mode=related&search

http://www.youtube.com/watch?v=33Jaodra7AY&mode=related&search=

Mercurianas no Distrito de Leiria




Peniche. 11 de Maio. O Festival Mercúrio chega a meio da sua programação. 11 espectáculos – várias salas esgotadas –, oito aulas abertas, uma sessão ao ar livre, tocaram um público de mais de 1 000 pessoas. Até final de Maio, a ESAD continua a ‘dar asas ao Teatro’!

Vários desta centena de jovens actores terão certamente uma palavra a dizer no meio teatral e não só: não havendo muito mais dados, retenha-se a verve do Raimunde, a segurança do João Pedro Santos (que sustenta a segunda metade do Ivanov), a força da Rosa, a polivalência do Daniel Coimbra (do caraicatural André, no Zeck, ao seráfico e lentíssimo Egeu, na Medeia, passando por extrordinário-compère da Rosa num Solo de Pasolini... é obra!), a concentração do Pedro Ribeiro (que sentido Jasão, na Medeia)…



Info 'oficial':

«Mercúrio – Festival Itinerante de Teatro» tem como missão promover a emergente actividade teatral da Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha, estabelecendo uma ponte entre a comunidade do Ensino Superior e o meio envolvente, proporcionando a abertura de um novo espaço de contacto, debate e fruição artística.

Com a organização do Festival Mercúrio, pretendem a ESAD.CR e a AIDC Associação Inovação Desenvolvimento e Ciência ‘dar asas ao Teatro’, um teatro experimental e contemporâneo, em ambiente de aprendizagem, que aspira a uma vertente social.


DA IMPORTÂNCIA DO MERCÚRIO

É num contexto de profundas alterações, turbulência e até de sensação de abismo perante o desconhecido que se vivem no Ensino Superior que a ESAD.CR propôe a realização do Projecto Mercúrio – Festival Itinerante de Teatro – e a sua implementação sustentada, como expressão regional pública de um projecto educativo com características próprias.

O Festival pretende valorizar algumas das áreas leccionadas na instituição: Animação Cultural e Teatro, e envolver alunos de outros Cursos, nomeadamente Artes Plásticas, Som e Imagem, e Design Gráfico; mas assume esse desígnio num registo de contacto franco com o público, criando, renovando e consolidando hábitos culturais. O Festival Mercúrio é por muitas razões muito mais que um mero projecto de itinerância cultural de uma Escola.

Queremos frisar a importância que este evento tem para uma escola de produção artística no que respeita à sua imagem exterior e à difusão daquilo que ali se faz; a importância de pormos em causa os nossos limites, de criarmos laços de humanidade entre pessoas diferentes, de procurarmos indagar o nosso conhecimento e o dos outros com aquilo que fazemos; a importância que um evento destes pode ter nas portas que está a abrir, na construção de organismos e estruturas que tentam melhorar a vida de todos nós.


Queremos partilhar com todos a importância e a magnitude desse gesto.
Bons espectáculos e melhor reflexão!

João Garcia Miguel e Mário Caeiro, coordenadores
Foto Miguel Nicolau


EVENTOS [27 Abril a 11 Maio]

O desafio era complexo e arriscado: proporcionar aos discentes uma experiência do real, em contexto público. Mais de cem alunos assumiram responsabilidades nas áreas da concepção, da organização, da produção, da comunicação, das relações institucionais [no caso da AC] e da encenação, da representação e da produção executiva [no caso do Teatro]. De muito amor e total entrega, também por parte de docentes e funcionários, nasceu um novo festival no Distrito de Leiria e as primeiras reacções a esta nova família – recolhidas junto do público, dos colegas, de responsáveis autárquicos, são unânimes: a iniciativa tem condições para evoluir e o seu carácter simultaneamente reflexivo e informal, pedagógico e convivial, asseguram-lhe personalidade própria.

Média de assistência:
116 pessoas/espectáculo!


A primeira metade do Mercúrio começou e acabou em Peniche. Cumpriu datas em Leiria [sede do Distrito] e Benedita [Distrito de Alcobaça], lotando várias salas e obtendo um média de público acima das 110 pessoas por espectáculo. Pesem as dificuldades organizativas, relacionadas com a escala do evento e condições e meios disponíveis, – que obrigaram a equipa de produção da Turma do 3.º Ano de AC a desdobrar-se em esforços para que o Festival acontecesse e dentro de custos controlados –, o saldo é ENORMEMENTE POSITIVO, a nível pedagógico, a nível cultural e a nível comunicacional.

Numa palavra, é possível afirmar que o Teatro da ESAD.CR, como forma de Arte de contacto humano, de proximidade, de elogio da palavra, do corpo, da luz e do acontecimento cultural, nas suas múltiplas expressões contemporâneas, naturalmente divergentes e até em concorrência acesa, assegurou um lugar próprio, uma visibilidade que se justifica plenamente. Esta afirmação resulta da constatação da disponibilidade total dos media locais – todas as principais rádios da Região, o jornal de referência das Caldas – para acarinharem um Conceito e um modus operandi capazes de, a curto prazo, darem origem a uma nova Centralidade Cultural. As reacções dos vários públicos confirmam-no de forma eloquente.



CENAS DE MEDEIA
SESSÃO ESPECIAL
Sexta-feira 27 ABRIL, Peniche, Auditório Stella Maris
DIR. DIOGO DÓRIA. 2.º ANO CURSO DE TEATRO
135 espectadores

Idosos oriundos de Instituições de Solidariedade Social do Concelho e arredores, jovens das CERCI de Peniche e Caldas da Rainha. para além de mais público que ali se deslocou de forma individual, tiveram a oportunidade de, no quadro de um evento de conceito inclusivo, ouvir as primeiras palavras ditas no Festival: uma introdução de Diogo Dória à Tragédia Grega e ao texto de Eurípides/Sophia de Mello Breyner Andresen, uma curta ‘aula’ que contextualizou um teatro que cala fundo no Mito, com poder de gerar repercussões directas na nossa cosmovisão, ou não estivessem patentes na peça temas da mais directa actualidade, como a condição da Mulher e o relacionamento com o Outro.

Para os alunos de Teatro, a experiência foi radical: as débeis condições de saúde de parte substancial do público, a irrequitude de muitos e os ruídos permanentes, obrigaram o elenco a um exercício de resistência de que nunca mais se esquecerão. O Mercúrio ‘obrigara’ a produção a acontecer, e esse foi o melhor prémio para todos. Comentário de uma senhora no público, no final: ‘isto que ali aconteceu vale muito dinheiro’. Tragédia Grega, sem concessões, em Terra de Mar, ouvindo-se as gaivotas sobrevoando o espaço físico do teatro. A iniciativa, entendida pelas instituições colaborantes como possibilidade de interacção social, gerou particular motivação junto dos seus clientes, nomeadamente as pessoas com deficiência, de que resultaram trabalhos, comentários e registos de âmbito pedagógico, focados em questões como as da Família ou da relação entre pais e filhos.
Agradecimentos especiais: CERCIPeniche e Câmara Municipal.


CENAS DE MEDEIA
Quinta-feira 3 Maio, Leiria, Auditório IPJ
DIR. DIOGO DÓRIA. 2.º ANO CURSO DE TEATRO
85 espectadores

Já em Leiria, nova apresentação da Medeia, agora com cenários trabalhados pictoricamente [solução plástica desenvolvida pelos actores-artistas]. Novo discurso de contextualização, desta vez por Guilherme Mendonça, e uma sala com as pessoas rendidas, em total silêncio e concentração, aos diálogos entre Medeia e Jasão, às interpelações do Coro. Vários docentes da ESAD.CR [Teresa Fradique, Emídio Guerreiro, Nélson Guerreiro] estiveram presentes. O primeiro espectáculo do Festival em Leiria foi um re-começo com o pé direito, na cidade-sede do Distrito e do IPL.




Zeck, ESAD, Abril 2007 - Foto de Luís Aguiar


ZECK.
Sábado, 5 MAIO, Leiria, Auditório IPJ
UM ESPECTÁCULO DE JOSÉ EDUARDO ROCHA.
FINALISTAS DO CURSO DE TEATRO E ARTISTAS CONVIDADOS.
120 espectadores

Depois da temporada de absoluto sucesso nas Caldas da Rainha, com cerca de 400 espectadores para quatro representações na Sala de Teatro 17 [Black Box], Zeck chegou a Leiria, em versão cinemascope e com condições técnicas melhoradas. Nas palavras de JER, ‘um público de 120 idosos, adultos, jovens e crianças [e até bebés] reagiu, riu, interagiu e aplaudiu do princípio ao fim’.



IVANOV
Quarta-feira, 9 Maio, Benedita,
Centro Cultural Gonçalves Sapinho
DIR. JOÃO GARCIA MIGUEL. 1.º ANO CURSO DE TEATRO
210 espectadores

Para os presentes na Benedita, público, elenco e docentes de Teatro, este foi um acontecimento memorável. Há quatro anos, o primeiro espectáculo dos alunos do 1.º Ano havia sido uma apresentação na Escola com meios técnicos rudimentares; quatro anos depois, os docentes viram os novos alunos de 1.º Ano pisarem um palco de qualidade, num auditório com excelentes condições a todos os níveis, num enquadramento comunicacional excelente. A promoção local do espectáculo – quase ‘porta a porta’ – realizada pelos alunos de Animação, a mobilização de Turmas na ESAD, aliada aos hábitos culturais que já vão sendo criados na Benedita, permiritam a actores que pisaram ali, pela primeira vez, um palco, uma noite electrizante, com direito a regresso para agradeciementos, diante do público de pé. Para os docentes presentes, foi o corolário in loco de quatro anos de afirmação de um Curso.


IVANOV
Sexta-feira, 11 Maio, Peniche, Auditório Stella Maris
DIR. JOÃO GARCIA MIGUEL. 1.º ANO CURSO DE TEATRO
60 espectadores

Aqui, a exiguidade do palco e as más condições acústicas do espaço – voltou a ouvir-se o ruído do café contíguo – voltaram a ser um desafio superado pelos actores, que provocaram no público ‘sentimentos fortes e vivências intensas’, ‘gritos e vozes que mexiam connosco’. Estiveram presentes responsáveis da ESAD.CR, ESTM e da CMP.


ENCONTRO PÚBLICO.
Sexta-feira, 11 Maio, Peniche, Fórum da Parreirinha
PORTO D’HONRA
150 espectadores, + 250 transeuntes

Mais de 250 pessoas passaram pelo Fórum durante o final da tarde e a noite, por casualidade ou curiosas pelo aparato de luz e televisores espalhados pelo ‘palco’ de madeira que domina a pequena praça. Diante de um fundo vermelho vivo, num ambiente quente com a iluminação urbana alterada por filtros vermelhos e as luzes do interior do Centro Cultural contíguo controladas por papel celofane, uma montagem rápida do Making-of do Festival explicitava o espírito da operação.

Cerca de 150 pessoas resistiriam à humidade da noite e, à hora prevista, 00h30, assistiriam a um slide-show de ensaios na ESAD.CR, ao som jazzy da guitarra eléctrica de Miguel Nicolau. O público foi muito diversificado, abrangendo de jovens a partir dos 10-14 anos até aos particiantes de um colóquio que se realizava no próprio Centro Cultural.




Solo Teatral/Ana Rosa, Fórum da Parreirinha, Peniche, 11 Maio 2007 - Foto de Bruna Oliveira

Ah, Rosa Vermelha!

Mas a noite foi da Rosa. Ana Rosa verteu com garra excertos de Orgia de Pasolini, ao lado [em cima…!] de Daniel, o perfeito compère, exemplar no papel de ausente-presente, esteio do brilho e da chama da actriz principal. Saber que este espectáculo foi decidido na véspera às 23h30, quando o próprio presidente da CMP sugeriu – e se houvesse amanhã aqui teatro, era possível…? – na ESAD.CR não apenas se fazem alguns milagres, como mantemos mantemos em aberto a opção de reagir ao tecido social e político de forma imediata e generosa; sem ter naturalmente de se converter em regra, este acontecimento improvisado e preparado num reduzidíssimo espaço de tempo revela todas as potencialidades de uma Escola artística com meios, soluções e gente para todos os desafios.

António José Correia, presidente da Câmara Municipal, assistiu ao evento e discursou, avançando o interesse da CMP na iniciativa. A Câmara excedeu os limites do mero apoio técnico, num sinal de inequívoco envolvimento. No espaço-agora da Parreirinha, aconteceu teatro urbano, mas sobretudo cidadania com criatividade. Estiveram presentes, a dar toda a força necessária, os Directores da ESAD.CR e da ESTM. No final, no palco, actores entretanto chegados do espectáculo da noite, a Turma de Animação, transeuntes e responsáveis autárquicos conviveram informalmente, com direito a improvisações de guitarra eléctrica, de novo pelo Miguel Nicolau.


MERCÚRIO NA RÁDIO
Rádio. Imprensa. Comunicação

Desde o início do Festival somam-se os minutos e páginas de cobertura pelos principais meios de Comunicação Social da Região do Oeste, com destaque para a cobertura do Evento possibilitada pelas ‘1/2 de Teatro’ proporcinadas pela TSF / Rádio Caldas, em horário nobre. Mas também outras rádios como a Rádio IPLay [com sede no IPL e relações estreitas com várias rádios locais], Rádio Batalha, a Rádio da Benedita, a Rádio Litoral Oeste [Óbidos] ou a 102FM Rádio [Peniche], entre outras em Leiria, Porto de Mós, Alcobaça, Marinha Grande, Nazaré, Rio Maior têm convidado responsáveis e elencos para entrevistas e depoimentos, ajudando as audiências a compreender o âmbito escolar da iniciativa e a sua vertente socialmente interventiva.

Na promoção e divulgação do Festival há ainda a destacar o trabalho exemplar da Gazeta das Caldas, que desde a primeira hora acompanha o Programa, com informação actualizada e útil.


CONTACTOS

http://web.esad.ipleiria.pt/mercurio

RESERVAS
teamreservas@mail.esad.ipleiria.pt

Paz, Pao, Habitaçao… 'AS OPERAÇÕES SAAL' EM FILME!


ESTAMOS PRONTOS PARA OUTRA.

As palavras são de Siza, trinta e tal anos depois do 'Processo' que lançou uma brilhante geração de arquitectos. Muito mais que uma nota de rodapé lírica na época do PREC, as Operações SAAL foram uma verdadeiro movimento de cidadania urbana que ensaiou soluções de participação popular na Vida Pública. As memórias e os mitos dos dias em que a Arquitectura esteve realmente perto das pessoas deram recentemente origem ao documentário 'AS OPERAÇÕES SAAL', de João Dias, com produção de Abel Ribeiro Chaves [Bazar do Vídeo]. É mais um Projecto-Memória-30 Anos da Extra]muros[.

A montagem ora truculenta, ora lírica, por um jovem realizador cujo pai esteve no SAAL do Algarve, resultou numa belíssima longa-metragem, que personalidades como Fernando Lopes e João Maria Grilo acarinharam e vão ajudar a lançar – já dia 4 de Junho de 2007, pelas 21h, no Cinema S. Jorge, por ocasião da Antestreia. Lá estarão os arquitectos José Bandeirinha, Nuno Teotónio Pereira, Manuel Vicente, José Neves, o fundamental Nuno Portas, e saber-se-á então que fazer com os sonhos justos em tempos de obscurantismo social. Uma luminosa experiência.

ALGUMA INFORMAÇÃO 'OFICIAL':


Sinopse

Paz, pão, habitação…
As Operações SAAL
é o documentário que faltava para ajudar a compreender as dinâmicas inerentes a um épico momento de encontro transformador, entre o fazer da cidade e os agentes dos movimentos sociais.

À distância de trinta anos, a produção de um documentário exlusivamente dedicado aos factos relacionados com as Operações SAAL propõe a reavaliação de todo o processo, suas metodologias e os resultados obtidos, especialmente no que concerne a complexa relação entre Estado, Habitação, Política e Projecto Urbano.


Introdução

‘A HABITAÇÃO É UM PROBLEMA SOCIAL,
LOGO DEVE SER UM PROBLEMA DA SOCIEDADE.’

As operações SAAL [Serviço Ambulatório de Apoio Local] foram durante um curto período após o 25 de Abril de 74, uma intensa experiência de democracia e intervenção participativas no domínio da habitação social. Ainda hoje continua a constituir uma referência para os Estudos Urbanos, pela forma como envolveu arquitectos, engenheiros, juristas, geógrafos, sociólogos e, sobretudo, os próprios moradores de bairros degradados, num esforço associativo para lutar por uma habitação condigna e pelo direito à cidade.

Trinta anos depois as memórias e as vivências das gerações seguintes ajudam a entender as repercussões sociais, culturais e urbanas desta mítica acção colectiva e multidisciplinar em que fazer a Cidade correspondeu a fazer justiça.



Objectivos do Projecto

‘NÃO DEVE HAVER CASAS SEM GENTE
ENQUANTO HOUVER GENTE SEM CASA’

Trinta anos depois da curta experiência de democracia participativa que se sucedeu ao golpe militar de 25 de Abril de 74, surgia no nosso país uma iniciativa de intervenção no domínio das políticas urbanas de habitação, a qual deixaria marcas na vida e na memória colectiva, tal como nas estruturas do poder.

As operações SAAL. Tuteladas pelo MFA [Movimento das Forças Armadas], envolveram arquitectos, engenheiros, ,juristas, geógrafos e sobretudo os próprios moradores de bairros degradados num esforço associativo no âmbito do qual foram criadas comissões para lutar por uma habitação condigna, «o direito ao lugar» e, implicitamente, uma sociedade mais justa.

Durante um curto momento em que convergiram as novas formas de intervenção estatal e lutas populares pelo direito a casas condignas, as operações SAAL destacaram-se pela sua importância exemplaridade e solidariedade.

Trinta anos depois, as memórias filmadas dos actores destes processos ajudam a reconstituir o período em que um esforço conjunto envolveu o Estado, intelectuais e movimentos populares na promoção de direitos sociais novos e na melhoria imediata das condições de vida das populações mais desprotegidas.

Wednesday, February 14, 2007

Neil Young em 71


Um aperitivo em…

http://www.neilyoung.com/archives/masseyhall/masseypromo_qt.html

Clássicos, os trapos.

On The Way Home
Tell Me Why
Old Man
Journey Through The Past
Helpless
Love In Mind
A Man Needs A Maid/Heart of Gold Suite
Cowgirl In The Sand
Don't Let It Bring You Down
There's a World
Bad Fog Of Loneliness
The Needle And The Damage Done
Ohio
See The Sky About To Rain
Down By The River
Dance Dance Dance
I Am A Child

Ao vivo e a solo, a estrela 'inoxidável', como lhe chamou a rock&folk há duas décadas, nesta altura ainda mais reluzente. E depois o tom da imagem 'à seventies'…

Comentário do artista: This is the album that should have come out between After the Gold Rush and Harvest. David Briggs, my producer, was adamant that this should be the record, but I was very excited about the takes we got on Harvest and wanted Harvest out. David disagreed. As I listen to this today, I can see why. Love you, David. NY

Mais em:
http://www.neilyoung.com/

Wednesday, February 7, 2007

Cultura. Dante[s].

Entrevista dada ao Jornal O GLOBO por 'Marcola', líder dos "gangs" brasileiros que puseram recentemente S. Paulo a ferro e fogo

- Coluna: Arnaldo Jabor

- "Você é do PCC?"

- Mais que isso, eu sou um sinal de novos tempos. Eu era pobre e invisível... vocês nunca me olharam durante décadas... E antigamente era mole resolver o problema da miséria... O diagnóstico era óbvio: migração rural, desnível de renda, poucas favelas, ralas periferias. A solução que nunca vinha... Que fizeram ? Nada. O governo federal alguma vez alocou uma verba para nós? Nós só aparecíamos nos desabamentos no morro ou nas músicas românticas sobre a "beleza dos morros ao amanhecer", essas coisas... Agora, estamos ricos com a multinacional do pó. E vocês estão morrendo de medo... Nós somos o início tardio de vossa consciência social... Viu? Sou culto... Leio Dante na prisão...

- Mas... A solução seria...

- Solução? Não há mais solução, cara... A própria ideia de "solução" já é um erro. Já olhou o tamanho das 560 favelas do Rio? Já andou de helicóptero por cima da periferia de São Paulo? Solução como? Só viria com muitos bilhões de dólares gastos organizadamente, com um governante de alto nível, uma imensa vontade política, crescimento económico, revolução na educação, urbanização geral; e tudo teria de ser sob a batuta quase que de uma "tirania esclarecida", que pulasse por cima da paralisia burocrática secular, que passasse por cima do Legislativo cúmplice (Ou você acha que os 287 sanguessugas vão agir? Se bobear, vão roubar até o PCC...) e do Judiciário, que impede punições. Teria de haver uma reforma radical do processo penal do país, teria de haver comunicação e inteligência entre polícias municipais, estaduais e federais (nós fazemos até Conference Calls entre presídios...) E tudo isso custaria bilhões de dólares e implicaria numa mudança psicossocial profunda na estrutura política do país. Ou seja: é impossível. Não há solução.

- Você não têm medo de morrer?

- Você é que têm medo de morrer, eu não. Aliás, aqui na cadeia vocês não podem entrar e me matar... Mas eu posso mandar matar vocês lá fora... Nós somos homens-bomba. Na favela tem cem mil homens-bomba... Estamos no centro do Insolúvel, mesmo... Vocês no bem e eu no mal e, no meio, a fronteira da morte, a única fronteira. Já somos uma outra espécie, já somos outros bichos, diferentes de vocês. A morte para vocês é um drama cristão numa cama, no ataque do coração... A morte para nós é o presunto diário, desovado numa vala... Vocês intelectuais não falavam em luta de classes, em "seja marginal, seja herói"? Pois é: chegamos, somos nós! Ha, ha... Vocês nunca esperavam esses guerreiros do pó, né? Eu sou inteligente. Eu leio, li 3.000 livros e leio Dante... Mas meus soldados todos são estranhas anomalias do desenvolvimento torto desse país. Não há mais proletários, ou infelizes ou explorados. Há uma terceira coisa crescendo aí fora, cultivado na lama, se educando no absoluto analfabetismo, se diplomando nas cadeias, como um monstro Alien escondido nas brechas da cidade. Já surgiu uma nova linguagem. Vocês não ouvem as gravações feitas "com autorização da Justiça"? Pois é. É outra língua. Estamos diante de uma espécie de pós-miséria. Isso. A pós-miséria gera uma nova cultura assassina, ajudada pela tecnologia, satélites, celulares, Internet, armas modernas. É a merda com chips, com megabytes. Meus comandados são uma mutação da espécie social, são fungos de um grande erro sujo.

- O que mudou nas periferias?

- Grana. A gente hoje tem. Você acha que quem tem US$40 milhões como o Beira-Mar não manda? Com 40 milhões a prisão é um hotel, um escritório... Qual a polícia que vai queimar essa mina de ouro, tá ligado? Nós somos uma empresa moderna, rica. Se funcionário vacila, é despedido e jogado no "microondas"... Ha, ha... Vocês são o Estado quebrado, dominado por incompetentes. Nós temos métodos ágeis de gestão. Vocês são lentos e burocráticos. Nós lutamos em terreno próprio. Vocês, em terra estranha. Nós não tememos a morte. Vocês morrem de medo. Nós somos bem armados. Vocês vão de três-oitão. Nós estamos no ataque. Vocês, na defesa. Vocês têm mania de humanismo. Nós somos cruéis, sem piedade. Vocês nos transformam em superstars do crime. Nós fazemos vocês de palhaços. Nós somos ajudados pela população das favelas, por medo ou por amor. Vocês são odiados. Vocês são regionais, provincianos. Nossas armas e produto vêm de fora, somos globais. Nós não esquecemos de vocês, são nossos fregueses. Vocês nos esquecem assim que passa o surto de violência.

- Mas o que devemos fazer?

- Vou dar um toque, mesmo contra mim. Peguem os barões do pó! Tem deputado, senador, tem generais, tem até ex-presidentes do Paraguai nas paradas de cocaína e armas. Mas quem vai fazer isso? O Exército? Com que grana? Não tem dinheiro nem para o rancho dos recrutas... O país está quebrado, sustentando um Estado morto a juros de 20% ao ano, e o Lula ainda aumenta os gastos públicos, empregando 40 mil picaretas. O Exército vai lutar contra o PCC e o CV? Estou lendo o Klausewitz, "Sobre a guerra". Não há perspectiva de êxito... Nós somos formigas devoradoras, escondidas nas brechas... A gente já tem até foguete antitanques... Se bobear, vão rolar uns Stingers aí... Pra acabar com a gente, só jogando bomba atómica nas favelas... Aliás, a gente acaba arranjando também "umazinha", daquelas bombas sujas mesmo... Já pensou? Ipanema radioativa?

- Mas... não haveria solução?

- Vocês só podem chegar a algum sucesso se desistirem de defender a "normalidade". Não há mais normalidade alguma. Vocês precisam fazer uma autocrítica da própria incompetência. Mas vou ser franco... na boa... na moral... Estamos todos no centro do Insolúvel. Só que nós vivemos dele e vocês... não têm saída. Só a merda. E nós já trabalhamos dentro dela. Olha aqui, mano, não há solução. Sabem por quê? Porque vocês não entendem nem a extensão do problema. Como escreveu o divino Dante: "Lasciate ogni speranza voi che entrate!" - Percam todas as esperanças. Estamos todos no inferno. "
 

Tuesday, February 6, 2007

Watcher of the... stage!






Em Setembro de 1972 foi lançado o quarto álbum dos Genesis, Foxtrot. A banda já tinha excelente reputação pelas suas actuações ao vivo com Peter Gabriel, protagonista de aparições em palco com o cabelo semi-rapado e vestes egípcias. Watcher of the Skies era a partir daí um tema-matriz do progressivo, Supper's Ready un tour-de-force desconcertante…
Foi por esta altura que Paul Conroy, da Charisma Records, sugeriu que alguém usasse a personagem egípcia em palco para promover o novo álbum; Peter Gabriel decidiu fazê-lo no concerto de Dublin, em 28 de Setembro de 1972, deixando o público perplexo. Foi também em 1972 que os Genesis actuaram pela primeira vez nos Estados Unidos, em Dezembro, nas cidades de Boston e Nova York. No ano de 1973, actuaram com sucesso em França, Itália e Alemanha; entretanto com a cobertura entusiástica nas primeiras páginas da imprensa musical, era preparada a tournée por Inglaterra.

O concerto de 9 de Fevereiro de 1973, no prestigiado Rainbow Theatre de Londres, mudou tudo para a banda.
Nesta altura, Adrian Selby, que era o designer da iluminação, teve a ideia de utilizar uma cortina branca como fundo do palco, por forma a esconder equipamento; usou também instrumentos brancos e equipamento de palco todo branco. Aplicou luz negra na iluminação - o que tornou a cortina completamente opaca - e assim criou uma atmosfera surrealista e única.

O primeira das inúmeras 'viagens' que os Genesis proporcionariam aos seus fãs

Foi no concerto britânico de 73 que a cabeça de raposa de espectáculos anteriores [no tema The Musical Box] foi substituída por novas máscaras e um guarda-roupa sempre em renovação, o qual se tornaria em imagem de marca da banda. Foi uma noite memorável. Depois dessa triunfal tournée britânica, a banda regressaria em Março e Abril aos Estados Unidos, fazendo mais alguns concertos novamente em França e na Bélgica. Cada vez mais, o processo artístico partia da ideia inovadora de combinar música e actuação teatral. No total, foram realizados 30 concertos da fase 'branca' dos Genesis. O disco Live, editado em Julho de 1973, é o testemunho deste período.

Aula Magna 2007

Este ano [2007], por sortilégio da vontade, da técnica e de uma paixão científica retro, volta a ser possível ao público [fãs e não-fãs] ver em Portugal um espectáculo que recria em rigor os espectáculos dos Genesis dos inícios dos anos 70 [não apenas a tournée de Foxtrot, mas também a de Selling England by the Pound]. THE MUSICAL BOX não é memorabilia kitsch nem nostalgia, é um projecto de museologia rock, feito por canadianos hiper-profissionais, que reconstituem as coisas com meticulosa precisão [e o apoio e autorização expressos pelos 'verdadeiros' Genesis]. Por absurdo, os espectáculos que aqui se referem são tão importantes como os originais – porque tal como tempo não se repete, o tempo 'repetido' também não…
Vejam-se as imagens… e procure-se as diferenças entre reconstituição e original! Para amantes do Tempo, da Arte, do Rock, da Luz, do Design de Cena, de Vigilantes dos Céus de carapuços geométricos e idiosincrasias outras que não cabem num blogue.

Toda a info:
http://www.themusicalbox.net/
http://jdo-productions.com/THE_MUSICAL_BOX_INTRO.htm

DVD sobre os Genesis e a sua passagem por Portugal:
http://webserver.cm-lisboa.pt/fonoteca/cgi-bin/info3.pl?20673&CD&0

Sunday, February 4, 2007

Richi Ferrero, amici in Torino



Richi Ferrero é um artista prometaico, pleno e festivo, nobre e presente, generoso e compacto. As suas intervenções urbanas em Turim, recorrendo a meios espectaculares mas sem perder o contacto com o sensível, permitem falar de uma 'fantasia urbana', ou como ele próprio designa numa edição de síntese da sua carreira, de um GRAN TEATRO URBANO. É amigo e companheiro de trabalho de muitos grandes da Arte Povera – movimento imerecidamente esquecido na curva do Poder, onde pontificaram Pistoletto, Merz, Anselmo… e Richi oferece uma espécie de contraponto mais teatral, cenográfico, performativo, dessa geração de mestres da Arte Contemporânea. Nenhuma cidade portuguesa ainda o conhece, mas é a altura de isso acontecer. Nas imagens, duas esculturas recentes, cada a uma dialogando com o espaço urbano de forma simultaneamente singela e poderosa. No site, uma panóplia de soluções artificiosas são exemplos de como fazer arte urbana espectacular e sensível, simultaneamente. www.richiferrero.it

Monday, January 8, 2007

Vitti, rosto de Antonioni?


L'avventura [1960] é uma aventura estética. Redundâncias à parte, é extraordinário ver ou rever Monica Vitti respladecente, ponto focal de uma sequência de planos lentamente articulados como composições abtractizantes. O 'mistério' de que por vezes fala Antonioni nas entrevistas apenas evoca lateralmente a certeza de cada olhar, cada visão, corresponder a uma convicção do conhecimento, ou não fosse a experiência de ver este filme próxima da de nascer de novo a cada plano. Não busco esoterismos, mas somente um tom que elogie estas imagens e esta história sem fim com profundeza e não apenas veneração fetichista [fácil em filmes como este, limpos e 'modais']. Oblíquas são estas minhas palavras e talvez ínvios os pensamentos, mas a atracção por aqueles rostos burgueses a cinza e brancos, a noção de que somos transportados para pinturas vivas de espaços arquitectónicos que se definem como paradigmas formais vivos, mesmo ali à nossa frente, chegam-me para uma sempre agradável reconcialiação com o cinema. Monica Vitti… sou eu.

NOTA: A Edição do DVD na CRITERION COLLECTION é brilhante. No site www.criterionco.com pode encontrar-se este pequeno ensaio que de forma mais estruturada deita luz sobre alguns aspectos essenciais do filme.


L'Avventura
- Geoffrey Nowell-Smith

A group of rich Italians is on a cruise off the coast of Sicily when one of their number—a moody, unhappy girl—disappears. Murder, kidnap, accident, suicide? Her boyfriend and her close woman friend search for her, but the search turns into a new love story, and the mystery is never resolved.

With this simple, elusive tale, director Michelangelo Antonioni launched himself into the forefront of the new emerging European art cinema. At the time of the film’s premiere he was 46 and had directed five previous features, all of them interesting but none of them able to massively capture the public’s attention. The premiere of L’Avventura, at Cannes in May 1960, was a disaster, with catcalls erupting throughout the auditorium. But the critics loved it and so—when it went on international release—did the public. With L’Avventura Antonioni’s career was made and the film is now an acknowledged classic.

Forty years ago, the film struck audiences mainly with its freshness; it can still have this effect today. It surprises with its insights: characters do unexpected things in unexpected places, but in a way that provokes recognition: yes, that does happen, though it doesn’t conform to clichés of how we think things ought to happen.

At the beginning of the film, Sandro (Gabriele Ferzetti) and his girlfriend Anna (Lea Massari) have an uneasy relationship. They have been apart for a while and getting together again they feel like strangers. When the cruise yacht stops at a deserted volcanic island Anna goes for a walk and doesn’t come back. The rest of the film hinges around the search for this girl who has mysteriously disappeared.

In fact, only two members of the cruise party pursue the search with any conviction: Sandro and Anna’s best friend Claudia (Monica Vitti). The search is complicated because Sandro soon gets distracted from looking for Anna and turns his attentions to Claudia. His inconstancy is not explained. There is little psychologizing and certainly no moralizing. After much hesitation, Claudia returns his affection and the two fall in love.

From the moment that Sandro’s pursuit of Claudia is suddenly converted into mutual passion the film changes momentum. Anna recedes more into the background but her absence continues to haunt the narrative, right until the very end. This absence—which is also a presence—is a key to the film. It inevitably brings to mind a comparison to Hitchcock, who plays with a similar motif in Rebecca (1940) and Vertigo (1958), and also dispatches his heroine early in the film in a film exactly contemporary with L’Avventura —Psycho. (Antonioni would later develop another Hitchcock theme, that of the wrong man, in The Passenger in 1975.)

In other respects, however, Antonioni and Hitchcock can be seen as opposites. In L’Avventura, events just happen; nothing signals them as significant. Anna does not actively disappear, she just is no longer on screen and neither the audience nor the other characters are aware of her not being present. Tension is generally slack and, when it builds, it builds obscurely, brought to life more by a surrounding uncertainty than by careful preparation and accelerating rhythms. Above all, chance is chance and no inexorable train of events is ever generated.

What L’Avventura showed was that films do not have to be structured around major events, that very little drama can happen and a film can still be fascinating to its audience. It also showed—and this was harder for audiences to grasp—that events in films do not have to be, in an obvious way, meaningful. L’Avventura presents its characters behaving according to motivations unclear to themselves as much as to the audience; they are sensitive to mood, to landscape, to things that happen, but they also behave in routine and conformist ways. None of them, except Claudia (who had, in her words, “a sensible childhood…without any money”), seems to have much consciousness of the lack of direction that afflicts them. They are, to use a word very fashionable at the time the film came out, alienated. But to say, as many critics did, that the film is “about” alienation is to miss the point. The film shows, it doesn’t argue. It convinces by the sensitivity and accuracy of its observation, not by heavy signals to the audience to think this, that, or the other.

More than any other film L’Avventura seems to define the spirit of a time in cinema when anything seemed possible and there was no territory into which it could not venture. Above all what it seeks to capture is the world of fleeting emotion, feelings which are unstable and crystallize only momentarily in the camera’s gaze. After L’Avventura, Antonioni did not look back. He made three further films with Vitti—The Night (1961), Eclipse (1962), and Red Desert (1964)—each time pushing further back the frontiers of what cinema could explore. It is hard to say which of these films is the best. But L’Avventura is the one that started Antonioni on his quest, and remains the one that most clearly represents the unique nature of his art.

Geoffrey Nowell-Smith is Senior Research Fellow in the Department of History at Queen Mary, University of London, where he directs a research project on the history of the British Film Institute. He is the editor of The Oxford History of World Cinema (1996) and the author of Luchino Visconti (BFI, 2003).